No dia 11 de Outubro de 2019 o Irmão David Araújo Junior apresentou na Loja Maçônica Edson Alves, a palestra sobre O Pavimento de Mosaico dando enfoque à visão Cabalísta do tema
IRMÃO DAVID ARAÚJO JR
O SIMBOLISMO E SIGNIFICADO CABALÍSTICO DO PAVIMENTO MOSAICO
Trabalho
apresentado à A.:R.:L.:S.: "Edson Alves", no. 4604, Oriente de
Uberlândia - MG - GOB
Este trabalho é carinhosamente dedicado ao Ir.:
Valdivino Vieira Nunes, meu irmão e pai do coração.
Pavimento mosaico ou
pavimento de mosaicos?
O pavimento mosaico
que estende-se no centro do templo maçônico tem especial importância analógica
e simbólica e constitui um dos ornamentos da loja.
Embora exista
literatura designando-o como "pavimento de mosaicos", este termo não
condiz com os primeiros escritos da Ordem. O adequado seria "pavimento
mosaico", no singular. O plural seria verdadeiro se tivéssemos vários
mosaicos na mesma estrutura.
Antes de
discutirmos o pavimento mosaico como analogia ou símbolo é preciso estudar a
origem do termo "pavimento mosaico". O termo "mosaico" pode
referir-se:
- Um painel de juxtaposição de pedras de distintas cores, formando
desenhos ou formas geométricas.
- Um adjetivo referente a Moisés, profeta hebreu, considerado o
maior deles pelos judeus, responsável pelo livramento do povo de Israel da
escravidão no Egito e a codificação da Torá e dos dez mandamentos fundamentais
do povo escolhido de Deus na antiguidade.
Pavimento mosaico como
juxtaposição de ladrilhos
Se tomarmos o
primeiro sentido podemos considerar o pavimento mosaico como um símbolo visível
de verdades maçônicas invisíveis.
Os quadrados
brancos e pretos simbolizam a dualidade do universo. Os opostos: claro e
escuro, luz e trevas, positivo e negativo, quente e frio, masculino e feminino,
o Bem e o Mal.
Os opostos fazem
parte de tudo que fazemos em nossas vidas. O maçon deve ter sabedoria para
caminhar sobre os opostos. O livro de Eclesiastes diz "Não sejas demasiadamente
justo, nem demasiadamente sábio; por que te destruirias a ti mesmo?" (Ec
7:16).

Não conseguiríamos viver neste mundo se fôssemos justos ou sábios o
tempo todo. Erasmo de Rotterdam, em seu "Elogio da Loucura" nos fala
da necessidade de traços de insanidade para que vivamos próximos uns aos
outros. É preciso ser um pouco louco para aceitar a loucura dos outros, que não
é nada mais que as diferenças entre nós. O Bem não seria valorizado sem o
contraste do Mal. As trevas e a luz são dois polos do mesmo espectro e a luz
excessiva nos cegaria, assim como a escuridão absoluta. O frio extremo e o
calor extremo matam. O masculino não subsistiria sem o feminino. O homem possui
características masculinas e femininas no seu corpo e na sua mente que dão o
equilíbrio nas situações da vida. O que nos atrai para o feminino é nossa
própria porção feminina. E vice-versa. A tese do negro e a antítese do branco
se unem na síntese.
A borda denteada que circunda o pavimento mosaico
simbolizaria o pai que congrega todos os filhos à sua volta, ou a humanidade,
constituída por todas as suas inconsistências e diferenças, unidas em um todo
coerente (um retângulo de dimensões áureas), limitados pela sabedoria e
onisciência do G.:A.:D.:U.:
Estas são interpretações possíveis e com elas poderíamos
nos estender indefinidamente.
Pavimento mosaico como símbolo cabalístico
No entanto, gostaríamos de discorrer sobre o significado
cabalístico do pavimento mosaico e da palavra "mosaico" como sendo
referente a Moisés e o povo israelita.
O simbolismo dos graus maçônicos é em grande parte
derivado dos ensinamentos e escritos mosaicos, segundo Albert Mackey.
A Cabala ("Tradição") é considerada a tradição
mística do ocidente. Sua existência é anterior aos sumérios, primeiro povo a
utilizar a escrita, 3000 anos antes da era cristã. Suas origens se perdem e não
há registro escrito da primeira menção aos ensinamentos cabalísticos. A Cabala
constitui-se de ensinamentos originados das tradições egípcia, suméria e
indiana. A tradição diz que os ensinamentos cabalísticos foram passados a
Abraão por Enoque ("homem consciente"), filho de Seth
("fundamento").
A Cabala oral perpetuou-se pelo discipulado dos mestres
aos aprendizes da antiguidade. A Cabala escrita surgiu com a língua hebraica.
Porém a Cabala oral continuou como tradição de ensinamentos passados pelos
rabinos nos círculos iniciados, como interpretações da cabala escrita (Midrash).
A Torá, ou Torah, é o conjunto de livros sagrados do
judaísmo que contém a Cabala escrita em hebraico, codificada ("o que está
à vista e não se vê"). Seu primeiro codificador foi Moisés, que segundo a
tradição, a recebeu no alto do monte Sinai. Os cinco primeiros livros da
Bíblia, o pentatêuco, formam o corpo da Torá na herança cristã.
O hebraico antigo, no entanto, não possuía vogais, apenas
consoantes. A leitura da Torá era reservada aos mestres, que davam sentido ao
texto ao incluir nele suas "vogais". Com isto o texto era aberto a
interpretações e ensinamentos que só poderiam ser passados aos iniciados
durante a leitura pelo rabinos. A Torá teria interpretações distintas
dependendo do ambiente espiritual em que era lida, permitindo infinitas combinações.
Sabemos pela fisiologia da linguagem que as vogais são
sempre vocalizadas através de um expirar controlado pelos músculos da fonação,
pela conformação da cavidade nasal e pela língua: um sopro controlado,
portanto.
Os
comentaristas cabalistas, como Gershon Sholem (1989) dizem que a verdadeira
Torá não é somente o conjunto de livros dados a Moisés no monte Sinai. Que a
Cabala primordial era considerada pelos místicos antes do século XIII como
escrita antes da fundação do mundo, com "fogo negro sobre fogo
branco". O fogo negro seria a lei escrita e o fogo branco a Cabala
mística, revelada espiritualmente.
Assim o branco do papel e o
negro da escrita tomavam sentido pelo sopro do mestre. E a Torá, embora visível
para todos, só assumia seu sentido mais místico pela expiração do mestre. E
tornava-se pessoal, dirigida a cada homem e sua história espiritual. De acordo
com o pentatêuco, lemos: "3Se andardes nos meus estatutos, e guardardes
os meus mandamentos e os cumprires... 12Andarei no meio de vós, e
serei o vosso Deus, e vós sereis o meu povo" (Lev 26: 3-12).
No
original hebraico o termo "andares" tem realmente o sentido de
locomover-se, ir adiante. Portanto, caminhar sobre o pavimento mosaico teria o
sentido de caminhar pela vida, guiando-se pela Lei de Deus, não só escrita e
acessível a todos os homens, mas interpretada por cada homem de acordo com a
inspiração dada pela lei natural, a lei que repousa na consciência de cada um.
Transfere, portanto, a responsabilidade de nossa conduta das mãos de outros
homens para torná-la individual. Se seguirmos os ensinamentos místicos de
acordo com a lei natural, estaremos fazendo aquilo que nos foi proposto desde o
princípio (a eternidade de Deus).
Ainda
mais, caminhar sobre o pavimento mosaico significa que o maçon deve caminhar
pela vida sabendo que há multiplicidade de interpretações e condutas, não
limitadas por esta existência, ou por sua existência particular. Portanto, um
chamado à humildade de caminhar por esta vida com a visão do aprendiz. Sempre
haverá uma Verdade oculta.
A
borda denteada também pode também ser interpretada cabalisticamente como parte
do pavimento mosaico e não somente um continente ou um limitador da vida
espiritual do maçon. Ela é formada por triângulos equiláteros alternados, com
os brancos com o vértice para o exterior e os negros com o vértice apontando
para dentro. Sua interpretação seria exatamente o contrário de uma contenção,
de um limite. Suas cores branca e preta apontariam para o caráter infinito da
Lei Divina. Enquanto os triângulos negros apontam para dentro, para o mundo
material, dirigido pela lei física, o mundo espiritual, ilimitado, simbolizado
pelos triângulos brancos, aponta para fora, para a eternidade, para o caminho
em direção ao G.:A.:D.:U.: O espírito é, portanto, ilimitado, e não prende-se à
forma ou ao mundo material.
Vale
notar também que a Física nos mostra que a cor preta é a ausência absoluta de
cores, enquanto o branco é a junção de todas as cores, segundo os experimentos
de Isaac Newton. O negro, neste contexto, é a ausência de diversidade, de
variabilidade, a Torá escrita com a intepretação estática, o plano físico. O
branco é o universo de possibilidades (cores) que a interpretação oral permite.
Há aí também uma mensagem aparentemente paradoxal. O branco não sugere mais a
ideia de vazio. Sugere a ideia de totalidade, de plenitude.
Conclusão
O
papel do símbolo é evocar a Verdade oculta e nos fazer trazer para a vida seu
significado e a sua prática. Neste estudo pude confrontar-me com a realidade da
diversidade de opiniões, verdades e intepretações contidas nos símbolos
maçônicos. A pesquisa me levou a fontes antigas, como a enciclopedia de Mackay,
um dos pilares de nossa maçonaria especulativa, ao mesmo tempo que me colocou
em contato com veículos importantes, atuais e fidedignos como a revista Ciência
e Maçonaria.
A
interpretação alternativa do pavimento mosaico em relação à Cabala nos dá um
novo olhar sobre um assunto que julgávamos saber, abrindo nossa consciência
maçônica para a grande verdade de estarmos todos aprendendo continuamente neste
longo, eterno e prazeroso caminho rumo à justiça e à perfeição.
Referências bibliográficas:
- Bíblia Sagrada
na tradução de João Ferreira de Almeida.
- Noções
Elementares de Cabala - A Tradição Esotérica do Ocidente - Francisco Valdomiro
Lorenz - Editora Pensamento.
- Pavimento
Mosaico - uma incursão simbólica pela Cabala medieval. - Rodrigo Peñaloza -
Revista Ciência e Maçonaria - Vol 1 (2): 137-156 - Jul/Dez 2013.
- Aprendiz Maçon
Pleno - João Dias - 2a. edição - 2016.
- Encyclopaedia of
Freemasonry - Albert Mackay - Moss and Company - 1874. Google Books.
- Simbolismo do
Primeiro Grau - Rizzardo do Camino - Livraria Maçônica Paulo Fuchs - sem data.
- Manual do
Aprendiz Franco Maçon - Introdução ao Estudo da Ordem e da Doutrina Maçônica -
Aldo Lavagnini - sem data.
- Elogio da
Loucura (Encomiun Moriae) - Erasmo de Rotterdam (1466-1536) - edição em pdf de
2002 do site dominiopublico.gov.br.
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